Jardim Botânico registra movimentação diferente dos animais na pandemia

Jardim Botânico registra movimentação diferente dos animais na pandemia

Os primeiros sinais de que os bichos estavam passeando por outros espaços foram o aumento dos vestígios encontrados, como pegadas e fezes

O isolamento social imposto para controlar a pandemia de Covid-19 tem transformado a vida e a rotina das pessoas. Sem poder sair de casa, as ruas e espaços antes ocupados ficaram vazios e silenciosos. No Jardim Botânico de Brasília (JJB), por exemplo, quem ocupa a área de visitação agora são os animais silvestres.

Veados, tamanduás-bandeiras, lobinhos-do-mato e aves de diversas espécies estão explorando novos espaços dentro da unidade em busca de alimentos já que não há visitantes

A mudança nos hábitos da fauna foi observada já no início do isolamento. A equipe de fiscalização do JBB realiza rondas diárias pelos cinco mil hectares das áreas abertas ao público e da Estação Ecológica do Jardim Botânico.

Os primeiros sinais de que os animais estavam se movimentando por outros espaços foram o aumento dos vestígios encontrados, como pegadas e fezes. Mas foi o olhar atento dos servidores e vigilantes que trabalham na unidade, somado às imagens das câmeras de monitoramento instaladas em locais estratégicos que constataram, que os bichos estavam ampliando a área de exploração e alterando os horários em que passeavam pelo jardim.

O biólogo e gerente de Educação Ambiental do JBB, Lucas Miranda, explicou a mudança no padrão de comportamento dos bichos desde o fechamento para visitação, em 23 de março. “A presença desses animais na área pública do jardim era observada antes da abertura dos portões, por volta das 7 horas, e depois do fechamento, às 17h. Agora, é possível avistá-los durante todo o dia. Sem a presença dos visitantes, o espaço virou um verdadeiro paraíso para os bichos. Os lagos e as plantas dos jardins temáticos acabaram atraindo a fauna”, reforçou.

No período, foram registradas a presença de diversos animais como veados-catingueiros (Mazama gouazoubira), tamanduás-bandeiras (Myrmecophaga tridactyla), lobinho do mato (Cerdocyon thous), além de cobras como jiboias (Boa constrictor), falsa-coral (Oxyrhopus trigeminus), jararaca (Botrhops sp.), e muitas espécies de aves.

Dados viram pesquisa

Todos os dados relacionados à presença da fauna no Jardim Botânico são coletados, catalogados e viram estatísticas importantes. “Aqui temos pesquisadores que sistematizam e analisam os dados que coletamos. Após uma avaliação detalhada das informações é possível determinar, por exemplo o grau de preservação do Jardim Botânico e identificar toda a biodiversidade presente em nossa área”, complementou Lucas Miranda.

A presença de animais como onça, lobo-guará, tamanduá-bandeira e veados, conhecidas como espécies guarda-chuva, são fundamentais para avaliar se o ecossistema está equilibrado e em boas condições. Qualquer desequilíbrio, por mais tênue que seja, já faz esses bichos desaparecerem. “O tamanduá e a onça, por exemplo, precisam de toda uma biodiversidade, muitas vezes microscópica, que não conseguimos ver a olho nu, para se abrigarem e viverem em uma área. Por isso o avistamento dessas espécies é muito importante tanto do ponto de vista ecológico quanto do preservacionista”, argumentou o biólogo.

Os registros, portanto, demonstram que a área do JBB, incluindo sua Estação Ecológica, está equilibrada e conservada. Além do monitoramento da fauna, existe uma equipe de botânicos na unidade para complementar a análise da biodiversidade.

Mudanças de comportamento

Outro fator importante observado pelos biólogos é como alguns animais são suscetíveis às mudanças dos seres humanos. De acordo com Lucas Miranda, algumas espécies se acostumam e se dão bem em ambiente antropizados, que são locais onde há ocupação do homem, exercendo atividades sociais, econômicas e culturais sobre o meio ambiente.

“Há registros de bichos que tiram proveito de áreas rurais com pastagens e monocultura para facilitar a busca por alimento, por exemplo. Aqui no Jardim Botânico percebemos que muitos animais, principalmente os grandes predadores, caminham pelas estradas e trilhas que abrimos para os carros. Acreditamos que seja mais fácil o deslocamento por esses espaços mais abertos”, argumentou.

Durante o isolamento social, os biólogos do JBB notaram nitidamente a alteração do comportamento. As imagens mostram veados tomando banho no lago do Jardim Japonês no meio da tarde, se alimentando das espécies de plantas da Agrofloresta tranquilamente e visitando diariamente as flores do canteiro central do Centro de Visitantes em qualquer horário.

Conscientização

A expectativa dos servidores do JBB é que a divulgação das imagens dos animais explorando a área de visitação sensibilize a comunidade sobre a importância de respeitar as normas de conduta. “Vamos utilizar esses registros para dialogar com os visitantes e convencer sobre a necessidade de respeitar as regras desse espaço, que é uma unidade de conservação. Queremos que a pessoa, antes de ir embora, recolha seu lixo lembrando que algum veado ou lobo-guará pode transitar por aquele local”, adiantou o biólogo.

O respeito aos limites de velocidade nas vias internas também é outra preocupação. “Os motoristas precisam ter cuidado ao transitar. A ideia é que não precise de quebra-mola e que as pessoas façam isso pela natureza mesmo. Quanto mais devagar, maiores são as chances de avistar um animal e ter a oportunidade de presenciar algo raro”, completou Lucas Miranda.

A emoção de ver um animal silvestre de perto é indescritível e desperta admiração e encantamento pela natureza. “O contato com animais em ambiente natural é diferente de zoológicos, onde o visitante já tem a expectativa de ver o bicho de perto. Conseguir observar um veado por 5 minutos é algo raro e trará a sensação de pertencimento e bem estar. Sentimentos que só um fenômeno raro como esse pode trazer”, concluiu o biólogo.

* Com informações do Jardim Botânico

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